Wednesday, August 16, 2006



Estamira
Os documentários são as grandes estrelas do "cinema da retomada". Por vária razões, talvez a principal o baixo-custo de produção, se comparado ao de um filme de ficção. Isso permitiu uma enorme quantidade de documentários chegar às salas de cinema, aliás um fenômeno particular do Brasil já que no resto do mundo documentário só passa em festival, mostras ou em casos excepcionais como os filmes de Micahel Moore. E como da quantidade quase sempre sai qualidade tivemos nesse período a afirmação de Eduardo Coutinho e seu cinema do "mínimo", José Padilha e o tratado de "Ônibus 174", Paulo Sacramento e o pluricinema de "Prisioneiro da Grade de Ferro". Claro que nem tudo é beleza mas aqui não falaremos das bombas. Estamira é um filme que se alinha à produção documentária brasileira de alto-nível. Marcos Prado, fotógrafo carioca, se dedicava há vários anos em documentar o dia-a-dia do lixão de Gramacho quando descobriu uma mulher, Estamira, esquizofrênica, trabalhando no local. Começou então a jornada de descobrimento do que havia por trás daquela profeta da verdade. O filme se incia com uma cena em preto-e-branco granulado na qual Estamira enuncia suas profecias, algumas extremamente lúcidas, criando o paradoxo que é a grande força do filme. Se revezando às cenas em preto-e-branco, que ilustram a jornada de particular de Estamira pelo seu mundo de "loucura" temos as cenas em cor que mostram a face dura da realidade, da vida. Aí descobrimos como Estamira se tornou o que é através de uma trajetória de vida recheada de acontecimentos absolutamente desgraçados que detonou esse desejo de viver no mundo em "branco-e-preto" da loucura. Através dessa personagem o filme, sem apelar para discursos sociológicos, filosóficos ou psicanalíticos, apenas com a força do audiovisual, questiona o que é loucura ou sanidade. E, sem medo de errar, Estamira é muito mais sã do que alguns de nosso mais próximos conhecidos.

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