Sunday, May 13, 2007


PROIBIDO PROIIBIR- JORGE DÚRAN- 2007

Uma característica, triste, do cinema brasileiro é que as condições econômicas de sua produção às vezes impões longos exílios a seus realizadores. Joge Dúran, chileno radicado no Brasil, havia dirigido seu último filme há mais de 20 anos "A Cor do Seu Destino"(1986) mantendo, em paralelo, uma prolífica carreira de roteirista "Pixote, a Lei do Mais Fraco" (1981), "A Maldição do Sampaku" (1991), "Como Nascem os Anjos" (1996) etc. Agora ele retorna com um filme ímpar sobre a juventude brasileira, um filme que não pretende ser tese sociológica e nem investigação da condição econômica e política de nossa juventude e sim, antes de tudo, cinema. E, sendo cinema, consegue com sucesso realizar todos aqueles propósitos acima descritos sem que o espectador, a princípio, se aperceba disso. Assim deve sempre um filme operar, ele será político se sua forma conseguir tocar o espectador em conjunto com seu conteúdo produzindo no espectador uma forma de afetação que é diferente daquela de um livro, de um jornal, de uma tese. Que é própria da arte.
O tema do triângulo amoroso entre amigos no cinema logo nos remete a "Jules & Jim", que , acredito, deva ser uma referência cara a Durán. Mas aqui não temos a trsiteza européia e francesa do filme de Truffaut, aliás um dos cineastas mais melancólicos do cinema-moderno. Em "Proibido Proibir" não há lugar para uma trsiteza "existencialista". Há muito o que fazer, muito o que construir, mesmo para o, aparentemente, cínico e hedonista estudante de medicina interpretado por Caio Blat. Aos poucos ele vai sendo atravessado pelas pessoas com quem convive no filme (em especial uma paciente que sofre de leucemia e que será o centro da trama "social" do filme) assim como somos atravessados pelo filme. O percurso dos três amigos, Alexandre Rodrigues, Maria Flor e Caio Blat os conduz a dois caminhos inicialmennte paralelos que irão se atravessar no final do filme: um amor "proibido" que nasce entre a namorada de Alexandre e o médico e a busca pela salvação de um dos filhos da paciente de Caio, o que os leva a penetrar no universo incômodo de nossas periferias e seus esquemas de poder paralelos. Ambos os processo são dolorosos e complicados, talvez além das possibilidades que esses jovens possuem, ilhados numa cidade que abandonou o progresso modernista, projeto falido (não à toa o filme tem a visita de Maria Flor ao prédio do MEC, projeto de Niemeyer, Le Corbusier e outros arquitetos importantes dentro do movimento modernista e termina com as ruínas de um projeto de Niemeyer na Rio-Petrópolis). Ilhados então num mundo além de suas forças o que permite a eles seguirem seu caminho é o amor, assim como o cinema às vezes nos ajuda a seguir os nossos caminhos, se tiver amor à vida e ao própio cinema.

Tuesday, May 01, 2007


OS DOZE TRABALHOS- RICARDO ELIAS- BRASIL-2006

O cinema brasileiro é formado por uma legião de esquecidos/redescobertos. A primeira vítima de peso desse processo foi Silvino dos Santos, o cineasta da selva. Autor da obra-prima “No País das Amazonas” (1923) foi relegado ao esquecimento nos anos 30 só sendo redescoberto em 1970 por ocasião de um congresso de cinema em Manaus. Outro nome dessa lista é Lulu de Barros, nosso cineasta mais prolífico, com mais de 80 longas e autor de um livro, “Minha Memórias de Cineasta”, editado nos anos 70 pela Embrafilme e atualmente fora de catálogo, fundamental para o estudo de nosso cinema. Ele seria depois recuperado pela turma de Sganzerla e Bressane na Belai, em filmes que continham amplas referências às chanchadas desse pioneiro. Depois a turma das chanchadas da Atlântida seria esquecida/renegada pelo Cinema-Novo e depois redescoberta pelos “marginais”, sendo definitivamente incluída na academia como objeto de estudos sérios nos anos 80/90. E assim iríamos falando da Boca-do-Lixo e de outros fenômenos de artistas esquecidos como muitos do “cinema-marginal”, como um Andrea Tonacci, que poucos conhecem, para serem redescobertos.

Esse parece ser o caso do cineasta paulistano Ricardo Elias, oriundo da Escola de Cinema da Usp (incrível como no Brasil ainda há gente que tenha preconceito contra escolas de cinema...) Seu 1º longa, “De Passagem”, já apontava os caminhos desse cineasta para a realização de filmes que lidam com as mazelas oriundas daqueles desfavorecidos economicamente, que no Brasil constituem a imensa maioria da população. Mas que vivem vidas, que no fundo, são tão parecidas com as de quaisquer um de nós com melhor condição econômico-social. Assim Ricardo olha seus personagens, não como objetos de um ensaio sociológico ou criaturas exóticas de outras realidades mas como personagens brasileiros situados em um meio específico que não os torna mais ou menos humanos.

Em “Os Doze Trabalhos” Elias retorna ao campo da investigação abordado em “De Passagem”, com tintas, aparentemente mais leves mas que no decorrer da narrativa apontam para aquilo que os gregos, criadores do mito de Heracles, nome do protagonista do filme, um motoboy, criaram: a tragédia. Não que a tragédia nos dias de hoje se dê por uma trama urdida pelos deuses e sim por um conjunto de fatores econômicos, humanos e sociais que levam, em algum momento, a um desenlace trágico como o que ocorre no filme. Mas o que impressiona fortemente no cinema de Ricardo Elias é, além da maneira com que filma seus personagens com dignidade a sua economia, o reconhecimento de sua próprias limitações. O maior exemplo disso é a cena em que Heracles se depara com o destino trágico que o filme destina a um de seus personagens. Nada espetacularizado, como vemos em certos filmes brasileiros como “Contra Todos” (2004), em que a imagem mata o cinema, ou o cinismo dos filmes de Sergio Bianchi como “Quanto Vale ou é Por Quilo?” (2005) em que a precariedade das imagens, no sentido pior possível, se alia a um projeto de nada, em termos de vida e de cinema. Nos filmes de Ricardo Elias, se não temos nada de virtuoso, sobra carinho pelo cinema e seus personagens.

O público não prestigiou este filme. Na sessão em que estive, num domingo à noite, sala vazia. Quem sabe um dia esse cineasta seja (re) descoberto. Enquanto isso vamos todos ver 300.